Dia.

Juliana, vinte três anos, carreira promissora, trabalho promissor. De rolo com algum cara aí. Tinha acabado de sair da casa dele, agora estava de volta à sua mesa. Seu sexto sentido não mentia, aquele cara lá era um cafageste, mas estava começando a cair de amores por ele. E rápido. Sentou-se na habitual cadeira e apertou o Power do seu computador. Checou se as coisas que havia deixado sobre sua mesa no dia anterior ainda estavam lá e deparou-se com um papel pardo que não reconhecia.
Arrancou rápido o conteúdo de dentro dele e estranhou a qualidade dos papéis. Folhas de caderno, ligeiramente amarrotadas, com marcas aqui e ali da caneta falha, denunciando que quem a escreveu, chorou sobre ela.
“Ele não te ama.” Começava assim a carta. Olhou ao redor, mas as pessoas perto de sua mesa, agiam e falavam normalmente. Quem era aquele? Quis continuar. “Ele fala da boca para fora que te ama, por que você disse primeiro. De verdade. Na mais dura e crua verdade. Baixar a cabeça a um homems só dá a ele passe livre para ele usar você como bem quiser. Sejamos francos. É isso sim, no fundo você sabe, só não vê por culpa da tua Hello Kitty interior.
Você não vê, por que seu ego não deixa. Você só é uma opção, para ele. Uma maldita opção. Quando não haver mais nenhuma outra dando bola, ele vai te catar. Desse jeito chulo mesmo. Ele vai e te cata. Nunca vai te amar. Não se lembrará do teu aniversário, dos dias felizes que você teve, ou se está usando seu melhor perfume, para agradá-lo. Só te usar e colocar pra lavar, para usá-lo de novo, quando estiver disponível. Como uma roupa. É, é isso o que você é pra ele. Uma porra de uma camisa.”
Não conseguiu conter a unica lágrima que lhe escorreu pelo canto dos olhos. Talvez a lágrima mais carregada de todas as lágrimas dos últimos anos. Aquele alguém sabia o que ela tanto se enganava. Doía encarar os fatos.
“Então olhe para os lados. Olhe para quem esteve ao seu lado esse tempo todo. Olhe para mim, caralho! Pare de se iludir e venha logo para mim. Pro otário que não te dá mais do que um mero bom dia no trabalho e te devora lentamente com os olhos, enquanto digita. Que mal consegue pensar quando você se levanta para pegar mais café. Ande, vamos! Olhe para mim. Por que estou esperando o mínimo dos teus contatos, para cair de quatro por você e entregar minha coleira.
Quero saber do teu passado, dos teus gostos. De que cor mais gosta, teus filmes favoritos, tuas taras secretas, o nome do teu escritor favorito. Quero abusar do teu corpo, te consumir inteira, te deixar ofegante e te trazer café da manhã, depois. Quero você. Só isso. E não para te usar como camisa não! É para sempre, ou o quanto você me quiser. Quero ser seu.
E você nem precisa se doar de volta. Eu me doo pelos dois. Faço o que você quiser. Não me importo se você for boa, ou má comigo. Desde que me seja alguma coisa.
Me dê a mão, vamos! Confie em mim!

E feche os olhos, quando o fizer”

Olhou para os lados de novo. Quem era aquele? Passou os olhos novamente pelos corredores, pelas cadeiras que aos poucos iam sendo ocupadas. Tinha alguém, dentre todos eles que a amava. Olhou para frente. E tinha mesmo. Perdeu o ar, quando o viu. Encostado no batente da porta de entrada, segurando dois copos de café. Ele sabia do café favorito dela, com creme em cima. Ele a conhecia, ela não sabia seu nome. Limpou a mancha que a lágrima fazia em seu rosto. Abriu um largo sorriso e depois colocou a carta sobre a mesa.

Fez com o homem que usava a mesa ao seu lado, o que sempre fez: Desejou-lhe bom dia.
Camila Marciano

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